CICLO DA
BORRACHA
A Sociedade da Borracha na Amazônia (1870 – 1815)
Durante
o período compreendido entre as últimas décadas do século XIX e o primeiro
quartel do século XX (1870-1915), ocorreu o processo de expansão e apogeu da
economia da borracha na Amazônia. Nesta época, a exploração da borracha
silvestre, através do extrativismo, foi possível em razão de diversos fatores.
Em primeiro lugar o desenvolvimento da indústria de pneumáticos, que
possibilitou uma crescente demanda pelo consumo da borracha nos países industrializados
da Europa e Estados Unidos da América e, portanto favoreceu o crescimento da
extração e exportação da borracha brasileira. Em segundo lugar, a borracha
silvestre brasileira (Hevea Brasiliensis), fez com que a Amazônia em pouco
tempo fosse o principal fornecedor de borracha em nível mundial, detendo
indiscutível monopólio. Outro fator foi a disponibilidade de mão de obra
necessária a extração do látex nas matas amazônicas, através da imigração
nordestina que garantia a extração da borracha por um custo baixo. Havia
também, a existência do sistema de financiamento da extração e comercialização
da borracha amazônica, através do aviamento que, favorecendo o processo de
dependência dos seringueiros em relação aos seringalistas, permitia justamente
a exportação da borracha pelos portos de Belém e Manaus; além de casas de
comércio estrangeiras na Amazônia que, fazendo importação e exportação de
produtos, acabava monopolizando a venda da borracha para os mercados europeus e
norte-americanos, permitindo o seu escoamento.
Do sertão seco a mata molhada
Foi
do sertão nordestino, principalmente cearense, árido e seco, que saíram não
somente os primeiros aventureiros que estabeleceram os seringais nos altos rios
amazônicos, mas também a imensa maioria dos que vieram a trabalhar como
seringueiros. Quais foram os motivos que levaram a intensa migração de
nordestinos para a Amazônia? Essa imigração ocorreu principalmente nos longos
períodos de seca na região, como por exemplo, a trágica seca de 1877, que praticamente
se estendeu ate 1880. Estima-se que só em 1878 emigraram para a Amazônia em
torno de cinquenta mil homens, mulheres e crianças, e outros tantos pereceram
de fome, sede e epidemias no Ceará. Outros motivos também contribuíram para
esse processo, como a crise na produção algodoeira no início da década de 1870
e a formação de excedentes populacionais no interior das unidades econômicas
tradicionais do Nordeste (pecuária tradicional). Os patrões faziam verdadeiro
recrutamento, financiando as passagens e despesas de viagem de vários migrantes
e acenando com vantagens e possibilidades de enriquecimento. Depois, é claro,
essas despesas eram computadas como dívida para o seringueiro, e constituíam
uma forma de prender a mão de obra.
O Seringal
Para
se abrir um seringal não era necessário comprar as terras onde ocorreria a
extração do látex, e sim simplesmente ocupá-las. Para esse processo era preciso
alguém que conhecesse a floresta e soubesse marcar as “estradas de seringa”, ou
seja, um mateiro; uma turma de seringueiros cujo número dependia da quantidade
de seringueiras existentes na área; e, sobretudo uma provisão de mercadorias
suficientes para sustentá-los durante os primeiros meses, até que um novo
carregamento pudesse chegar. Essas mercadorias eram normalmente conseguidas a
crédito com as “casas aviadoras” de Belém ou Manaus, ou seus intermediários
mais próximos nos seringais já abertos, que também muitas vezes financiavam a
vinda de migrantes nordestinos. Assim essas casas aviadoras que forneciam todo
o crédito necessário a formação de novas áreas de extração da borracha,
ganhando com isso uma relação de dependência com os patrões das áreas que se
obrigavam a pagar seus débitos com borracha, requerendo novos créditos para
temporadas posteriores.
A
grande maioria dos seringueiros, porém, chegava a seringais já abertos, e com
sistema de produção e comércio já bem organizado. Ao chegar no seringal, o
“brabo”, como era chamado o seringueiro que não tinha ainda experiência,
recebia no barracão os suprimentos para a sua primeira quinzena na mata:
farinha, jabá, sal, sabão, querosene para a iluminação, uma espingarda,
munição, e os instrumentos para o corte da seringa, a machadinha, tigelas e o
balde para colher o leite. Todas essas mercadorias eram anotadas em sua
conta-corrente, juntamente com as despesas da viagem, e o desafio era
conseguir, mesmo sem experiência, “tirar saldo” nessa conta, ao final da
temporada de corte da borracha.
Durante
o período de colheita do látex, entretanto, a vida do seringueiro era bastante
trabalhosa. Acordava-se geralmente às duas horas da manhã para começar o corte
das arvores, tendo que inicialmente caminhar entre três e seis horas para fazer
as incisões na casca das heveas e colocar as tigelinhas abaixo do corte para
que o leite caísse dentro. Depois que chegava ao ponto final, o seringueiro ia
“quebrar o jejum” e pegar o balde para recolher o leite. Mais uma
caminhada, de árvore em árvore, recolhendo o látex das tigelas. E ao final da
trilha, sem demora era necessário passar ao processo de defumação da borracha
(transformação do leite através de calor em forno especial em uma bola de
borracha escura).
O
seringal geralmente compreendia grande extensão de terra, bastante variável. A
margem do rio que lhe dava acesso, normalmente ficava o Barracão, que podia ser
apenas uma construção compreendendo a residência do proprietário, o armazém e o
escritório, ou podia ser composto de várias construções separadas. Em torno do
barracão não era raro que houvesse alguma criação de gado e porcos para
alimentar o patrão e seus empregados, bem como para os dias de festa.
Entretanto nesse período o seringal era basicamente uma unidade de produção de
borracha que importava praticamente tudo que era necessário para a subsistência
dos que aí viviam. A imposição das mercadorias constituía uma forma de
impossibilitar aos seringueiros a acumulação de saldos favoráveis em suas
contas com o patrão, e deste com as casas aviadoras; gerando lucro ainda maior
para os últimos.
A Crise
Desde
que foi descoberta pelos europeus, a borracha prestou-se a múltiplos usos:
sapatos e capas impermeáveis, seringas, bolas para jogos, etc. Porém, com a
Revolução Industrial que se processou ao longo do século XIX, esta
matéria-prima passou a ocupar lugar estratégico para toda a indústria, já que
foi usada na confecção das máquinas a vapor, entre outras, tornando seu
funcionamento muito mais eficiente. Cedo, portanto, os ingleses perceberam o
valor estratégico da borracha, então somente encontrada, em sua espécie mais
produtiva e de melhores características para a indústria – a Hevea
brasiliensis, na floresta Amazônica. Assim, ao se dar conta do grande valor da
borracha, a Coroa Inglesa logo encontrou meio de quebrar o controle brasileiro
sobre o produto: tratou de cultivá-las em suas colônias do Oriente.
No
entanto, a domesticação da Hevea brasiliensis foi um processo demorado e
burocrático que levou cerca de cinquenta anos desde a obtenção dos primeiros
espécimes pelo jardim Botânico Real de Kew, na década de 1850, e o início da
produção das primeiras Heveas cultivadas no Oriente, em fins da década de 1890.
essas sementes foram plantadas e replantadas, enxertadas e experimentadas até
que se conseguiu planta-las em escala comercial no Sri Lanka e, principalmente,
na Malásia. O plantio era feito em fazendas no estilo plantation, utilizando-se
a mão de obra extremamente barata dos trabalhadores asiáticos. Além do mais,
diferentemente dos seringais nativos, nas fazendas de cultivo asiáticas as
árvores eram plantadas em fileiras, próximas alguns metros umas das outras,
tornando o trabalho muito mais fácil de controlar e, portanto, muito mais
produtivo e barato.
A
borracha do Oriente começou a atingir o mercado em 1890, ainda em pequena
escala, porém não demorou em ultrapassar a produção amazônica, a partir de
1913. Como consequência da grande quantidade de borracha no mercado, bem como
dos menores custos de produção da borracha oriental, o preço do produto começou
a cair em grandes proporções. A queda vertiginosa do preço da borracha fez
desmoronar toda a estrutura montada sobre o comércio da borracha silvestre na
Amazônia, e que somente conseguia sustentar seus lucros, divididos em diversos
níveis, por meio do preço elevado do látex. As firmas aviadoras, que
praticamente financiavam as safras da borracha, conseguindo, no período de
ascensão dos preços, lucros espantosos, foram as primeiras a sentir os efeitos
da queda dos preços. E juntamente com as firmas aviadoras, os bancos, casas
importadoras e exportadoras, comerciantes atacadistas, entre outros membros da
cadeia comercial da borracha, também faliram ou tiveram de enfrentar longa e
dura decadência em seus negócios. Contudo, a produção da borracha não parou, e
na verdade diminuiu muito pouco nos anos que se seguiram à crise.
Durante
esse período, os seringueiros adquiriram maior autonomia perante os patrões,
especialmente nos seringais mais distantes. Porem não houve extinção total do
sistema de aviamento, que ficou reduzido a poucas mercadorias de troca,
mas mercadorias essenciais. A queda do preço da borracha gerou verdadeira
transformação social na Amazônia na criação de um novo modo de vida, com a
subsistência por meio da produção agropecuária em pequena escala e do
extrativismo (caça, pesca e coleta). Essa transformação também significou que
os seringueiros tornaram-se aos poucos uma população tradicional, ou seja,
mantêm grande dependência em relação ao território que ocupam. Portanto, para
compreender a Amazônia de hoje, é imprescindível o estudo do que aconteceu com
a crise da borracha e a transformação dos modos de vida das populações que aqui
viviam.
A Batalha da Borracha: 0 Estado e o
Negócio da Borracha
A
batalha da borracha foi um grande investimento feito em conjunto pelos governos
do Brasil e Estados Unidos, na região amazônica, com o objetivo de produzir
borracha silvestre para suprir os Aliados (bloco liderado pela Inglaterra,
França, Estados Unidos e União Soviética), durante a Segunda Guerra Mundial,
deste produto estratégico para a guerra. Com a invasão japonesa dos seringais
do Oriente, e a posição do Japão favorável à Alemanha e à Itália, os estoques
de borracha dos Aliados começaram a diminuir muito, e a produção brasileira no
mercado não era suficiente para a demanda.
Desse
modo, para aumentar a produção em pouco tempo era necessário muito mais que o
aumento do preço da borracha. Entre outras iniciativas adotadas, como o
estabelecimento do monopólio estatal sobre o comércio da borracha, foi
imprescindível a mobilização de milhares de migrantes nordestinos rumo a
Amazônia, os chamados “soldados da borracha”.
A
forma de encaminhamento dos novos migrantes aos seringais agora obedecia a um
contrato-padrão e a uma série de medidas que visavam aparentemente assegurar
alguns direitos aos seringueiros, e muitos aos patrões, agora chamados de
“seringalistas”. Havia um serviço de saúde e higiene, um kit composto de rede,
sandálias, prato, copo, etc., e até treinamento para os futuros seringueiros em
Belém do Pará. Além dessas vantagens pecuniárias, havia outras que eram
prometidas pelo governo, como: isenção do serviço militar obrigatório,
pagamento de pensão a família em caso de morte ou invalidez, contrato de dois
anos, entre outras.
RESPONDA:
1. O que foi o sistema de aviamento durante
o ciclo da borracha?
2. Qual era a
função do “aviador” no contexto da extração da borracha, na Amazônia, durante o
ciclo da borracha?
a)
contratar o serviço dos serigueiros e organizar econômica e administrativamente
as regiões onde era extraída a borracha.
b) levar
os imigrantes nordestinos para as plantações de seringas, protegendo-os de
ataques indígenas.
c)
transportar de avião cargas com látex para os Estados Unidos e Europa.
d)
construir aeroportos nas regiões das plantações de seringueiras, com a
finalidade de escoar o produto para fora do país.
e)
apresar e empregar a força do trabalho escravo indígena na extração da
borracha.
3. A Amazônia viveu o sonho transitório de
riqueza graças à borracha. A borracha ocupou folgadamente o segundo lugar
dentre os produtos brasileiros de exportação, alcançando o ponto máximo entre
1898 e 1910. Boris Fausto
Dentre
as consequências dessa atividade econômica para a região, podemos citar:
a) Foram alteradas substancialmente
as condições sociais, graças à melhor distribuição de renda e à qualidade de
vida dos seringueiros.
b) Provocou migrações da região
sudeste, base da mão-de-obra utilizada nesse ciclo extrativista.
c) Gerou o crescimento da população
urbana, migrações da região nordeste, concentrou a renda, entrando em declínio
devido a concorrência da produção inglesa e holandesa na Ásia.
d) Não trouxe concentração de renda
nem alterou o modo de vida das capitais Belém e Manaus.
e) Constituiu-se no ponto de partida
do desenvolvimento e na diversificação das atividades econômicas da região.
4. A
produção de borracha na Amazônia:
a) Favoreceu a ascensão social do
seringueiro.
b) Propiciou o aparecimento do
regatão.
c) Instituiu o barracão como unidade
produtiva.
d) Incentivou o acúmulo de capital e
do mercado interno.
e) Consolidou o sistema de aviamento.
5. Quais as cidades mais
beneficiadas com o ciclo da borracha?